Agradecimento pelos olhos do Diogo e da Tugce (Graça Franco)
Tugce e Diogo merecem que lhes agradeçamos terem tido "olhos" que não fingiram não ver e com isso nos ajudarem a manter abertos os nossos!
Obrigada
Recupero o seu nome numa busca da net: Diogo Andrade e Sousa. Faço-o porque, em Agosto, segui durante vários dias, através de alguns amigos da família, a angústia da sua morte. Bastou 'googlar' "jovem de sucesso esfaqueado no Cais do Sodré" para reencontrar a história do arquitecto estrangeirado de 28 anos que, durante umas curtas férias em Lisboa, encontrou estupidamente a morte. Em mãos deixou os projectos nas Caraíbas em que estava a colaborar e uma vida recheada de amigos e promessas. A perda do jovem talento foi notícia pela violência da morte: esfaqueado na zona do Cais Sodré, porque ousara defender uma amiga do assédio de um gangue.
A sua morte foi lamentada, sobretudo, pela perda inútil do seu reconhecido talento, mas a verdade é que Diogo não estava sozinho naquela movimentada rua na noite de diversão, mas fora ele a cometer a "loucura" de tentar intervir. E é por esse gesto de coragem que é exemplo de luta contra a indiferença e o medo que nos vai tolhendo.
Esquecera injustamente o seu nome e recupero-o hoje para o associar à homenagem que mais de 170 mil alemães (unidos numa inédita petição) pretendem prestar a uma jovem compatriota de origem turca reclamando que o Estado, a título póstumo, lhe entregue uma medalha de mérito reconhecendo-a uma espécie de heroína nacional. Coisa que até a senhora Merkel, já fez saber, também verá com muito bons olhos.
Quem era? Tugce Albayrak não viveu o suficiente para se transformar numa jovem de sucesso. A 15 de Novembro foi brutalmente espancada, no parque de estacionamento de um McDonald's, na pequena localidade de Offenbach, nos arredores de Frankfurt. Foi a consequência de ter, alguns minutos antes, contribuído para salvar duas jovens do assédio de que estavam a ser vítimas na casa de banho do restaurante.
Tugce não foi a única a testemunhar o crime que estava a ser cometido no interior, mas só ela teve a coragem de não fingir que não via o que estava a acontecer. Essa ousadia custou-lhe a vida. Brutalmente espancada, entrou em coma naquela mesma noite( tal como acontecera a Diogo depois de esfaqueado), e acabou por morrer mais de uma semana depois, no dia em que festejaria 23 anos.
Esta quarta-feira a mesquita de Wachtersbach foi pequena para acolher os mais de 1.500 presentes para as cerimónias fúnebres que um canal de TV alemão transmitiu em directo. O caixão coberto pelas bandeiras da Turquia e Alemanha seguiu depois para o discreto cemitério de Bad Soden-Salmunster, localidade de onde a jovem de origem turca era natural. Às cerimónias, que comoveram o país, assistiram o embaixador da Turquia e o governador do Estado de Hesse em reconhecimento pelo acto de coragem demonstrado.
Um dia antes do espancamento de Tugce já o jornal "El Mundo" dava conta dos resultados de um estudo sociológico levado a cabo pela organização sueca STHLM Panda . O estudo visava testar como reagiriam testemunhas acidentais a um caso de violência doméstica. A equipa de sociólogos colocou uma dupla de actores no interior de um elevador simulando uma discussão que começava numa troca de impropérios e acabava em violência física sobre uma jovem mulher. A cena repetiu-se por várias viagens, filmada por câmaras ocultas, e testemunhada pelos vários passageiros acidentais que não suspeitavam da simulação.
Os resultados da experiência foram desanimadores e mostram uma espécie de anomia social que talvez possa designar-se como a "síndroma de não querer ver".
Entre 53 pessoas que acabaram por testemunhar a cena apenas uma mulher ousou por fim à violência com uma ameaça: "Se voltas a bater-lhe chamo a polícia." Os restantes fingiram não ver.
À saída, confrontadas pelos sociólogos para explicarem a sua actuação, todas as testemunhas, todas sem excepção, se mostraram envergonhadas por não terem feito nada e aliviadas por ter sido apenas uma experiência. Dá que pensar. Juraram não repetir.
É por isso que Tugce e Diogo merecem que lhes agradeçamos terem tido "olhos" que não fingiram não ver e com isso nos ajudarem a manter abertos os nossos! Obrigada
In RR online 09-12-2014
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